A Terceira Guerra Mundial

14 11 2009

– Pai, que fruta é aquela?

– É uma jaca.

– Ai, pai, como é feia…

jaca

Foi esse o diálogo que ouvi no supermercado, enquanto fazia minhas comprinhas semanais. A garota que fazia a pergunta tinha seus doze anos e era uma graça de adolescente, com a pele lisinha e os cabelos finos e claros. Portadora de tanta suavidade e juventude, não admira que achasse feia a jaca, escura e espinhenta por fora, e tão estranha por dentro, cheia de tripas e fiapos.

Caetano Veloso diz que “Narciso acha feio o que não é espelho” e esse episódio comprova exatamente isso. É muito difícil aceitar aquilo que é diferente de nós, e muitas vezes sequer nos damos conta dessa dificuldade. O exercício da tolerância, a aceitação do outro não naquilo em que ele se parece conosco mas exatamente no que ele tem de diferente torna-se muitas vezes tarefa quase impossível.

Durante a missa católica há uma hora em que o padre diz: “Abrace o irmão!” e nós nos viramos para quem está ao nosso lado, geralmente alguém que não conhecemos e nos abraçamos com esse desconhecido, sorrimos para ele, desejamos-lhe “a paz de Deus” e ficamos com isso muito felizes, achando que estamos sendo nobres e bons porque abrimos os nossos braços para um desconhecido.

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O que esquecemos é que aquele “irmão” que está ao nosso lado na igreja é provavelmente da mesma classe social que nós e que, também como nós, tomou banho, colocou desodorante e trocou de roupa antes de ir para a igreja. Esse irmão, meu caro leitor, é muito fácil de abraçar. Não há nenhum mérito nisso. Mas como abraçar o irmão que mora na rua, que está embriagado e caído na sarjeta? Como abraçar a irmã que se aproxima de nós no semáforo, vestida de trapos, com uma criança imunda nos braços? Como abraçar o irmão que expõe seu corpo e sua desdita, envergando seus trajes bizarros, nas esquinas das avenidas deste país?

Fazer o bem sem olhar a quem é uma coisa muito difícil. Fazemos, mas queremos gratidão eterna. E só fazemos o bem a quem achamos que merece esse bem, e não a quem realmente precisa dele. Uma pessoa iluminada me disse um dia que cada um de nós deveria fazer uma boa ação diária; mas essa boa ação só contava a nosso favor na contabilidade divina se ninguém soubesse que nós éramos o autor, nem mesmo a pessoa beneficiada. A imagem do escoteiro atravessando a rua com a velhinha, se exibindo aos olhos de todos, seria a antítese de uma boa ação de verdade.

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Essas idéias e pensamentos vêm à minha cabeça enquanto assisto ao noticiário na televisão e vejo os habituais e diários fatos que acontecem nas cidades do mundo: guerra, intolerância, violência, assassinato… É a Terceira Guerra Mundial que já está nas ruas, com suas batalhas em cada esquina, aqui pelos pontos de venda de droga, acolá porque uma moça entrou de vestido curto na universidade, ali na frente porque alguém encheu a cara e resolveu voltar para casa dirigindo um carro. Isso sem falar nas bombas explodindo e retalhando inocentes porque acima do chão minaretes brigam com torres encimadas por cruzes, e por baixo da terra o petróleo estende seu leito negro e viscoso…

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A Terceira Guerra Mundial é gerada pela ganância, pela intolerância, pela loucura. É claro que existem outras saídas, que há a possibilidade de Paz, tanto na esquina de casa como no chamado Oriente Médio. Mas é impossível ganhar dinheiro com soluções pacíficas. A máquina de guerra quando entra em ação gera dinheiro e poder, mesmo às custas do sangue dos inocentes.

Então, é tentar, pelo menos nas nossas vidas pessoais, aumentar as nossas atitudes de tolerância e incrementar nossa compreensão e aceitação daquilo que é diferente de nós, para contrabalançar a energia gerada pelos senhores da guerra e pelos chefões do tráfico.

Vamos deixar de ver na inocente jaca sua face espinhosa e feia, e vamos mergulhar no mel do seu coração de ouro, deliciosos bagos amarelos que enchem nossa vida de doçura e sabor.

 

Este post vai para o meu amigo Washington Araújo, paladino das causas nobres, em quem eu me miro e gosto de ter como exemplo.